Resenha da obra "Pentecoste e pentecostalismo: uma abordagem sociológica teológica" de Marcelo Gesta

 


RESENHA

Neemias Raimundo

GESTA, Marcelo. Pentecoste e pentecostalismo: uma abordagem sociológica teológica. São Paulo: fonte Editorial, 2015. 194 p.


Detentor de estilo meticulosamente dicionarizado, o pastor Marcelo Gesta traça excepcional análise - desde sua gênese - de todos os aspectos envolvidos no fenômeno do movimento Pentecostal; se utilizando em sua abordagem, da “instrumentalidade das Ciências da Religião sob uma ótica sociológica” (p.14); descortinando amplo material elucidativo e informativo, que vem ao encontro do público igrejeiro – onde o tema ainda suscita dúvidas – assim como para todos aqueles que buscam entender essa notável faceta da Igreja do Senhor Jesus no Brasil.

 

O autor discorre sobre os significados do termo “pentecoste” como “A Pentecoste”, a festa judaica e “O Pentecoste”, o fenômeno sagrado gerador do movimento pentecostal; assim como de todo o contexto histórico dos fatos. Seus arrazoados transitam através de questões inerentes ao tema, como fé, razão, sagrado e profano em “um contexto histórico e bíblico, e que dentro deste se dá o fato histórico e, também fenômeno sagrado” (p. 40) - (pp. 17-41).

 

Diligentemente, Gesta perpassa todo o desenvolvimento da linguagem do fenômeno sagrado, ocorrido em complexa simbiose, através de símbolos, metáforas, vínculos, comportamentos, cultura, símbolos sociais e fatos sociais: “Outras vezes, o fenômeno sagrado, transcendente e indescritível que é, produzirá uma linguagem simbólica própria, metafórica, na tentativa de explicar o inexplicável” (p. 56). Desde o início, é flagrante o seu cuidado ao lidar com tais questões, por demais sensíveis e preciosas (pp. 47-67).

 

O secularismo também é apontado como evento catalizador dos diversos movimentos de restauração, dentre os quais, “o’ pentecostes, que simbolizará ‘o batismo no Espírito Santo’, surgirá e funcionará em torno de tal como uma ‘nova forma de ativismo evangélico’: o pentecostalismo” (pp.78,79). Gesta apresenta o pentecostalismo como fato e fator social, que reivindica, influencia e identifica posturas, atitudes e performance do indivíduo; o pentecostalismo “é principalmente fruto de uma determinada cultura, mas também formador e desenvolvedor de toda uma nova cultura ou culturas” (p. 80). O aspecto batismal envolvido no tema recebe ampla análise, desde a etimologia do termo “batismo” até sua “apropriação” por pentecoste (fenômeno sagrado e/ou festa), pentecostalismo e pentecostais (pp. 73-96).


 É notável o cuidado de Gesta quando adentra no campo das Ciências da Religião e se encontra na posição de analisar o pentecoste sob a vertente mitológica; ele esclarece sobre a deterioração do termo “mito”, que sempre conectado a qualquer “acontecimento originário” nas Ciências da Religião, foi ressignificado, sobretudo por críticas no intuito de “desabonar a veracidade da experiência religiosa”, classificando-a “como pura crendice primitiva” (p. 100). Depois de elaborada explicação sobre o real significado de “mito”, Gesta assevera que “pentecoste não é mito”, todavia, mesmo reconhecendo “excelentes teólogos pentecostais”, critica a postura “não científica e/ou não acadêmica; mas principalmente, não teológica” de “inábeis articuladores pentecostais”. Isto posto, o fenômeno sagrado do pentecoste seguiu-se como de “modo conceitualmente confuso”, sendo apresentado desde o início, “talvez de forma ingênua dentro de uma dinâmica própria da mitologia, fato que gerou, deu e ainda dá ensejo, no ‘imaginário evangélico popular comum’ a diversos equívocos e equivocidades” (p. 102). Ainda que o fenômeno sagrado do pentecoste seja tratado academicamente como “mito” por ser um “acontecimento originário”, e utilizar a “mesma metodologia do mito” deve-se, portanto, evitar a confusão conceitual - pontua Gesta (pp. 99-105).

 

No intuito de fornecer informações sobre a origem dos termos “pentecostalismo” e “pentecostal”, Gesta remonta à Europa do século 18 e às origens das igrejas protestantes no Brasil do século 16 e traz informações relevantes sobre as germinações do movimento. Gesta traça todo o desenvolvimento e contextura dos termos, assim como todos os desdobramentos possíveis de sua utilização. “Se o fenômeno sagrado pentecoste foi a causa para os filhos de Deus serem templos do Espírito Santo [...], então todos os que são filhos de Deus são pentecostais, visto que somente filhos de Deus podem ser templos do Espírito Santo de Deus” (p. 130) - (pp. 107-132).

 

Não foi ignorado por Gesta, o aspecto dos estereótipos e preconceitos denominacionais entre pentecostais e tradicionais, que ocorrem por questões comportamentais; “Como vemos não se trata exatamente de assunto e/ou percepção teológica, mas psicossociológica” (p. 142). Tais estereótipos não seriam totalmente negativos, afirma, “podem também criar idéias positivas, mas que não deixam de ser pré-concebidas” (p. 144). Gesta compila um breve resumo da concepção brasileira sobre pentecostais e tradicionais, seus valores, forma de culto, comportamento etc. avaliando como negativa a visão estereotipada e como tal postura se desenvolve. “Os estereótipos nunca são uma representação verdadeira e de caráter racional das pessoas ou grupos por ele rotulados” (p. 150). Ainda que tradicionais e pentecostais busquem dialogar, persistem as ressalvas mútuas por alguma divergência doutrinária – lamenta Gesta – acrescidas do afastamento exegético e hermenêutico entre os grupos; restando-lhes apenas a reducionista afirmativa: “nós apenas praticamos e pensamos de forma diferente sobre o mesmo texto bíblico, mas somos irmãos em Cristo” (p. 152) - (pp. 141-153).

 

 Os últimos aspectos abordados tratam sobre comportamentos, que tendem mais a ser “o produto acidental – e algumas vezes artificial – de padrões culturais assimilados através da relacionalidade, que propriamente o resultado didático proveniente de ensino teológico ou de experiências com o sagrado” (p. 158). Tais comportamentos seriam influências culturais, identitárias e relacionais; aprendidos, assimilados, forjados, desenvolvidos, ensinados etc. Conforme Gesta, quando um grupo religioso se encontra e interage cultuando, “num mesmo grupo ancestral ou primordial” irão desenvolver por sua “relacionalidade”, uma forma própria e característica de cultuar “tais como a linguagem verbal, a forma de gesticular, a forma de cantar etc.” (p. 161). O comportamento pode também ser imposto, visando a preservação das normas vigentes do grupo. “Assim, aquilo que é normal e normativo para o grupo de natureza denominacional pentecostal, por exemplo, poderá ser anormal e antinormativo para o grupo de natureza denominacional histórica, tradicional e vice-versa” (p. 164). Trata-se, afirma Gesta, de interações com um grupo, submissão às regras, “normas religiosas” e “circunstâncias emocionais”, somente posteriormente e, talvez, busca-se uma  análise “racional e teológica” (pp. 157-171).

 

Esse agir perpetuado e socializado, uma aprendizagem, virá a ser formador de uma personalidade; no caso, a pentecostal, processo inerente ao ser humano, pois “os padrões básicos de comportamento dos animais não humanos são transmitidos através da herança biológica. Já os padrões de comportamento do homem são transmitidos e aprendidos através da comunicação simbólica” (p. 176). O comportamento, portanto do religioso evangélico, reflete o grupo em que está inserido, sem, no entanto arguir sobre o corpo dos ensinamentos que segue. “Assim, o hábito é um costume que se for perpetuado criará um tipo distinto de caráter e este caráter distinto ‘apontará para um destino’!” conclui Gesta. (p. 183) – (pp.173-186).

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