Resenha da obra "A Face Mais Íntima de Deus" de Renold Blank.
RESENHA
Neemias Raimundo
A Face Mais Íntima de Deus
BLANK,
Renold. A face mais íntima de Deus: Elementos-chave da Revelação. São
Paulo: Paulus, 2011. 207 p.
Incisivamente,
Renold Blank nos apresenta o Deus encarnado em Cristo através da faceta que foi
ignorada a partir do século IV a. C. de forma inconsciente pelos cristãos de
todos os tempos, e convenientemente, pelos detentores do poder. A obra “A face
mais íntima de Deus” traz à luz da Bíblia Sagrada, conforto, paz e esperança às
vítimas de quaisquer feitios de legalismo, exclusão, perseguição, violência
etc. e lhes anuncia o Deus bíblico que não quer ser temido, mas anseia por ser
amado. Perpassa por toda a obra, o incômodo do autor pela utilização histórica
dos atributos divinos de onipotência, onisciência, eternidade etc. para
legitimação e garantias mútuas dos poderes políticos e religiosos. Tais
atributos, explícitos por toda a narrativa bíblica, são, na verdade – conforme
Blank – direcionados para “ajudar aqueles que [Deus] ama” (p. 14).
O
Deus bíblico anunciado por Blank, mormente ser absoluto, não se situa ao lado
dos poderosos, mas se posiciona sempre com os fracos e desprotegidos. Não
apresenta fixação por templos luxuosos e, apesar de ter-lhe sido “construído um
ao preço do suor e sofrimento do povo” (p. 20), rejeita todas as formas de
opressão; e, desde o êxodo hebreu no Egito, até os atuais, sofisticados e
desumanos métodos de maximização de lucros, “há uma única resposta religiosa:
Deus é contra!” (p. 26). O ideal divino para o homem de uma vida repleta de
felicidade, foi interpretada como “vida espiritual”; o enfoque social contido
no decálogo, foi substituído por um legalismo mesquinho e perverso; tais
posturas, retratam a forma humana de “calar tal Deus incômodo que assim se
manifestou” (p. 23). Se Deus se posiciona em defesa dos fracos e oprimidos,
questiona Blank, nenhuma instituição que se refere a ele deveria transigir com
nenhuma forma de opressão (p. 5-48).
O
contexto em que Jesus habitou também é abordado por Blank em suas peculiaridades;
a percepção da relação entre Deus e os homens era totalmente retributiva (a
posição social era vista como bênção ou castigo). O extorsivo sistema
tributário religioso – além dos impostos devidos ao império romano – resultava
em uma situação drástica de injustiça social. Havia uma parcela da sociedade
que era excluída do acesso ao templo e à “comunhão oficial” com Deus; e uma
classe privilegiada que cobrava e usufruía dos impostos, além de atuar como
“mediadores” entre Deus e os homens. Cristo denunciou esses desmandos se
posicionando ao lado daqueles que eram desprezados pelo sistema, na busca de
recuperar “o cerne libertador da Torá” (p. 56). As críticas, atitudes e o agir
de Jesus frente ao sistema religioso de seus dias, devem ser vistos como
postura do próprio Deus, e dessa forma, como revelação teológica para todas as
religiões. O Deus revelado em Cristo faz opção pelos pobres, pelas vítimas da
injustiça, opressão, legalismo, por todos os rejeitados e se inclina a favor da
vida (p. 49-108).
Deus
mostra seu modelo de homem ao se revelar verdadeiro homem e verdadeiro Deus em
Cristo; contrária às expectativas humanas, sempre focadas no vencedor, Deus,
através de uma nova perspectiva antropológica, se apresenta humilde, cheio de
compaixão e contrário à prática dos poderosos que durante milênios preconizaram
as características divinas de poder e autoridade no intuito de legitimar seus próprios
domínios. A verdade muito pouco assimilada pelos cristãos de todos os tempos
está incutida no Natal, com a imagem de uma criança indefesa, desamparada e
frágil; pronta a ser amada e não temida. Ao contrário da figura de um general todo
poderoso que inspira respeito e temor; nunca o amor (p. 109-152).
Blank
cita a análise sobre as raízes da violência do antropólogo René Girard ao afirmar
que os homens fazem uso do nome de Deus para justificarem a própria
agressividade; e formataram a representação de um Deus vingador, que exige
sacrifícios, projetando como vontade de Deus, seu próprio agir violento. O Deus
bíblico se coloca ao lado das vítimas dos sacrificadores e mostra-se contrário
à postura daqueles que crucificaram a Cristo quando no ato da ressurreição, “confirma
e corrobora de maneira plena e total tudo aquilo que seu filho tinha dito e
feito” (p. 169). Outrossim, o fato da religião cristã permanecer identificada
pela cruz ao invés do signo da ressurreição, influenciou uma teologia de
sofrimento e sacrifício; ao contrário, afirma Blank, deve-se compreender que a
cruz somente alcança seu objetivo “porque foi superada pela ressurreição” (p.
183); ação pela qual Deus se mostra contra todos aqueles que referendam seus
atos de violência em seu nome.
A
ressurreição de Cristo também exerce papel escatológico de esperança futura
para as vítimas de quaisquer sistemas fundamentados em poder, punição,
intimidação, etc. e confirma que os propagadores dessas práticas não
prevalecerão. Através da ressurreição, comprova-se a fidelidade de Deus, sua
capacidade de ressuscitar mortos para uma nova vida e a realidade de nossa
própria ressurreição; referenda-se também, através da ressureição, o potencial
de Cristo para justificar os pecadores; e finalmente, através da ressurreição
de Cristo, mostra-se de forma insofismável, a implantação do Reino de Deus.
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